A escoliose, comumente considerada uma deformidade da coluna, é uma patologia presente nas populações humanas em todas as regiões do planeta e ao longo da história. Segundo Halter e Krödel (1997), é frequente encontrar em cemitérios antigos corpos com colunas escolióticas. Em estudo realizado em múmias egípcias (FRITSCH et al, 2015), encontrou-se alta incidência de escoliose (12%).
Os autores observam que tais múmias apresentam alterações secundárias típicas de pacientes modernos com escoliose, como degeneração da coluna e torção do tronco, o que indica que se trata da mesma patologia.
Como essas pessoas viviam, se cuidavam e eram cuidadas, que papel social desempenhavam, sabe-se muito pouco. Obras antigas de filosofia, religião, mitos e contos de fadas, que datam desde 3500 aC, evocam imagens de pessoas com deformidade na coluna, por vezes gravemente desfiguradas, frequentemente estigmatizadas, ridicularizadas, temidas e odiadas (HALTER e KRODEL, 1997; MOEN e NACHEMSON, 1999).
Figuras emblemáticas da cultura ocidental, como o Corcunda de Notre Dame, trazem a marca da escoliose relacionada à exclusão social, sujeitas a toda sorte de estigma. Por um lado, observa-se também, há certa “naturalização” da deformidade, como um destino inevitável, ao qual não há como escapar.
Esse estigma está presente hoje, sobretudo entre adolescentes, visto que é nessa fase da vida em que geralmente a escoliose aparece. Relatos em grupos de pessoas com escoliose em redes sociais, consultórios e encontros de pacientes evidenciam os processos de bullying na escola, a vergonha do corpo deformado, as dificuldades na socialização com o uso de coletes ortopédicos.
O tratamento da escoliose tem sido objeto de intervenções mais diversas há mais de 2 mil anos, com o objetivo de “endireitar” a coluna, chegando mesmo a constituir o símbolo da ortopedia: uma árvore torta, amparada por uma estaca. A figura, presente no livro de Nicholas Andry, de 1741, intitulado “L’Orthopédie ou l’art de prévenir et corrigerdansles enfants lesdifformitésducorps” simboliza o termo cunhado por ele a partir de dois vocábulos gregos: orthos (direito, sem deformidade) e paidon (criança) (PROENÇA, 2008).
Assim, a gênese da ortopedia marcada pelo “endireitamento do corpo”, tem a escoliose como uma patologia fundante.
No século XVIII e no começo do século XIX, o tratamento da escoliose centrou-se, principalmente, na correção conservadora da deformidade da coluna, com uma variedade de formas de espartilhos, coletes e instrumentos de tração. Em meados do século XIX, a fisioterapia estabeleceu-se como um tratamento ativo suplementar (HARMS, RAUSCHMANN e RICKERT, 2015).
O método de Cobb, para medir a magnitude da curva da escoliose por meio de radiografia, foi descrito em 1948, como relatam Moen e Nachemson (1999), constituindo o principal método utilizado até hoje. Na mesma época, tornou-se popular o colete Milwaukee, criado inicialmente para a imobilização pós-cirúrgica.
Já as primeiras cirurgias para tratamento da escoliose foram realizadas em 1839, na França. Desde então, muitas técnicas cirúrgicas foram experimentadas, mas a mudança principal se deu no início dos anos 1960, com a introdução de implantes de metal na coluna (HARMS, RAUSCHMANN e RICKERT, 2015).